MARIO MOREIRA CHAVES: E O PRIMEIRO LIVRO DE ATAS DA ARL.

 

O primeiro livro de atas de uma Academia, é sua Certidão de Nascimento.

Nele se encontram as raízes do sodalício.

Mário Moreira Chaves soube guardar com muito carinho essa relíquia da ARL que continua preservada graças ao trabalho dos diversos Presidentes que me sucederam.

Eis uma história que guardarei para sempre em meu coração e memória, e que começou pelo  Parecer abaixo:

 

 

PARECER DO ACADÊMICO MÁRIO MOREIRA CHAVES SOBRE OS TRABALHOS LITERÁRIOS —APRESENTADOS PELO SR. ANTONIO CARLOS TÓRTORO, CANDIDATANDO-SE AO PREENCHIMENTO DA VAGA NA CADEIRA NO. 24 – PATRONO ANTONIO BAPTISTA CEPELOS, NA ACADEMIA RIBEIRÃOPRETANA DE LETRAS.

 

FORMA E CONTEÚDO NA POESIA DE AGORA

 

O poeta Antonio Carlos Tórtoro representa, neste momento e para mim, verdadeiramente, uma perplexidade. Porque, pela primeira vez, após sessenta anos de vivência e convívio atuante no mundo da Poesia no Brasil, jamais deparei com um poeta do gênero que este representa: um Poeta-Novo.

Realmente, ACT é um Poeta-Novo, isto é, um poeta dos novos tempos em que vivemos agora — aqueles a que nos acostumáramos  a rotular de “Contemporâneo” inadequadamente, desde que a humanidade passou a viver a fase mais crucial de todos os tempos — a Nova Era — onde tudo está transformado, diferente e novo. Ele é o Poeta-Novo porque se distancia literalmente de tudo quanto já foi ensinado e falado, escrito em matéria poética: não pertence e nem obedece a nenhuma das escolas conhecidas ou estilos consuetudinários, mesmo até os mais proverbiais. Não se coaduna com nenhum dos ISMOS existentes que definem todas as obras artísticas.

É que, na Literatura conhecida e compulsada desde os séculos transactos, nada se encontra de semelhante à maneira e ao estilo de poetar do autor. Ele é Novo. Profundamente Novo no nosso tempo. Evidentemente, é necessário que se afirme que esse poeta não é Modernista ( aqui me refiro ao gênero de poesia inaugurada na Semana de Arte Moderna de 1922) porque moderno é expressão usual e permanente de todos os tempos nas artes, para designar a renovação dos processos e estilos de compor arte —  Virgílio, Dante, Horácio, Petrarcas e tantos outros da antiguidade, aqueles que renovaram sua forma ou seu estilo, eram modernos, por contrariarem as formas vigentes.

Portanto, podemos e devemos considerar ACT um criador de Poesia Nova, diferente, na forma e no fundo, em relação às demais ora existentes. Isto, assim afirmado, pode parecer aos menos avisados, que não consideramos válidos os trabalhos do autor de “Ecos” e “Edelweiss”. Porém, muito ao contrário, consideramos seguramente que seu autor está criando uma NOVA POESIA — A POESIA DO NOSSO TEMPO. Porque, da leitura de seus poemas e da análise da sua forma e conteúdo, chegamos à conclusão, comovidamente, que todas ou quase todas, na sua maioria, representam uma faceta nova no campo da Literatura poética. Seus escritos transcendem ao tempo e espaço, porquanto ele é o criador, por excelência — criador por compulsão — e tudo que ele passa para seus poemas são seus, legitimamente seus: criação do seu pensamento, expressão do seu sentimento, transubstanciados em palavras que dizem, em forma original, sem influências, sumamente expressivas, transmitindo ao leitor, com limpidez o que existe em ebulição criadora na sua mente.

É por isso que o poeta não se atem às regras convencionais da Arte Poética tradicional, que tem séculos de existência e que transmudava a poesia em estereótipos de pura imitação.

Seus versos soltos ou brancos, sempre rigorosamente sintáticos, expõem, sem floreios e nem hermetismos vocabulares, as ideias que expõe. Vejamos, de seu livro “Ecos”, um exemplo: o poema “Hermafrodita” : quem e quando escritor algum abordou tal tema com tanta precisão que quase se aproxi8ma da verdade cósmica da alma irmã. Todavia, pudemos observar que alguns dos poemas de ACT lembram, às vezes, a maneira das “Elegias de Duino”, de Rilke, como por exemplo, neste trecho da Nona Elegia:

 

“Entre malhos subsisto

Nosso coração como a língua,

Entre os dentes, e que, no entanto,

permanece a exaltadora”.

 

E, nalguns temas, vagamente se aproxima do metafísico Teixeira de Pascoais, poeta português, pelo seus misticismo e sensibilidade.

Entanto, não pudemos deixar de observar a peculiaridade do uso da rima leonina, que da maneira colocada no poema torna-se apenas em eco da rima anterior, exorbitando portanto da real aplicação da rima interna, já de há muito em desuso e que nada acrescenta ao valor e expressão do verso. Todavia, tais detalhes absolutamente não desmerecem e nem apequenam o valor do global da obra do autor que, pelos seus altos méritos criativos e força de expressão, sem dúvida merece tomar assento na Cadeira requestada em nosso sodalício

Esta a nossa opinião e voto.

 

MÁRIO MOREIRA CHAVES

Ribeirão Preto, 10 / 12/ 1993.

 

 

UM POUCO DA MINHA HISTÓRIA COM MÁRIO MOREIRA CHAVES

 

“Os espíritos imortais dos mortos falam nas bibliotecas.”

Plínio, o moço

Quando assumi a presidência da ARL em 18 de março de 1994, sucedendo ao Dr Luiz Carlos Raya, tomei conhecimento de que a academia tinha um bibliotecário , Dr João Caetano de Menezes.
Mas cadê a biblioteca ?
Aos poucos, descobri alguns livros da tal “biblioteca” numa prateleira na biblioteca do SESC , rua Tibiriçá, 500.
Descobri, também, que o restante da “biblioteca”, aliás, a maioria do acervo,  se encontrava em poder do acadêmico Mário Moreira Chaves, e fui até a residência dele. Já em avançada idade, e sem um espaço adequado para guardar  livros, revistas, jornais, ele os havia colocado nos fundos da residência, onde estavam sendo, aos poucos, deteriorados pela ação das intempéries.
Pagamos, então, ao proprietário de uma caminhoneta para recolher, no mesmo dia, o acervo do SESC e da residência de Moreira Chaves, pouco antes do falecimento desse inesquecível acadêmico, de rara cultura, presidente do sodalício ( 1952 – 1953) na época  de sua fundação em 1947.
Adquirimos prateleiras e um armário de aço novos que, foram colocados na biblioteca do Colégio Anchieta, rua Chile , 845, por uma deferência especial do Prof. João Alberto de Andrade Velloso, mantenedor do estabelecimento de ensino. Colocamos neles tudo que poderia ser aproveitado.
Um trabalho árduo, mas compensador”.
Enfim, desse contato com Mário Moreira Chaves — acadêmico que avaliou meus poemas ( juntamente com Ely Vieitez Lisboa e Nilva Mariani)  no final de 1993,  para aprovar minha entrada na ARL ,— nasceu entre nós uma relação de confiança recíproca a ponto de ele, em uma de minhas idas à sua residência, entregar-me o 1º livro de atas da ARL , e todos da academia diziam que ele não o entregaria a ninguém enquanto vivo, dado o amor e respeito que dedicava à história que  ajudou a transformar-se em realidade.
No dia de sua morte, fui logo cedo ao velório para receber seu corpo e tomei conhecimento de que ele desejava ser sepultado com a Bandeira do Estado de São Paulo.  Voltei à minha casa, apanhei a Bandeira Paulista que eu guardava há muito tempo,  sem imaginar que ela cobriria a urna funerária de um homem que escreveu, com seu trabalho e amor pela cultura, páginas inesquecíveis da história ribeirãopretana no final do século XX e que, à sua maneira, de acordo com as suas possibilidades, preservou um patrimônio no Palace, graças ao trabalho de minha cara amiga Vera Regina Gaetani, encontrou por algum tempo,  um espaço digno para ser visto, pesquisado e admirado por todos aqueles que amam e preservam a nossa história, a história da Academia Ribeirãopretana de Letras, que se confunde com a própria história de Ribeirão Preto.

 

 

 

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