LI E GOSTEI: O MUNDO AOS MEUS OLHOS

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AS MULHERES DE RITA MOURÃO

A violência doméstica contra mulheres é algo que, infelizmente, ainda está no lar de muitas famílias. Algo que se repete na ficção através das novelas como, por exemplo, “Fina Estampa”, quando o personagem Baltazar (Alexandre Nero) protagonizava cenas de violência contra a sua esposa, Celeste (Dira Paes) e ela se calava mediante a agressividade do companheiro.
Para quem vê de fora, fica a dúvida: por que muitas mulheres ainda se calam diante da humilhação a que são submetidas por seus maridos? Por que sofrem caladas? Por que não denunciam seus maridos?
Quando nos deparamos com notícias e relatos dessa espécie, somos movidos por dois sentimentos: raiva do culpado e indignação pelo sofrimento da esposa. Podemos citar os seguintes fatores que foram mencionados pelos entrevistados atualmente em diversas pesquisas como motivadores da passividade feminina frente ao problema da violência, qualquer tipo de violência:
Medo do agressor, dependência financeira e/ou afetiva em relação ao agressor, não conhecer os seus direitos, não ter onde denunciar, percepção de que nada acontece com o agressor quando denunciado, falta de autoestima, preocupação com a criação dos filhos, a sensação de que é dever da mulher preservar o casamento e a família, vergonha de se separar e de admitir que é agredida, acreditar que seria a última vez, ser aconselhada pela família ou pelo delegado a não denunciar e não ser possível retirar a queixa dada.
Mas vejamos como esse tipo de relação conflituosa entre homens e mulheres pode ser vista de forma, por incrível que pareça, poética.
Como?
Conhecendo algumas mulheres/personagens de Rita Mourão em seu livro “O mundo aos meus olhos – contos e crônicas”.
Vejamos, por exemplo, Laila e o marido, em A grande Noite ; Virgínia e Régis, seu amante ; a dama do relógio e André; Filomena que, ao final, entra em sono profundo, sono bom que só seria despertado numa esfera bem longe, além dos sonhos; Matilde em Quarto Mandamento, a que não quis mais acordar; Ester que se aproxima de Jacó e joga sobre ele o fascínio da fêmea que se soltara de dentro dela; a poetisa sonhadora que gostava de ler Fernando Pessoa, em Descompasso; Lisa e seu Apolo em A outra: todas mulheres fortes como a própria Rita Mourão, ficcionista e grande mulher.
Enfim, como diz WP ao final de seu prefácio, há muitas facetas a explorar na prosa poética de RM o que proporciona sempre, aos seus leitores, um prazeroso encontro entre leitor e autora.
Quanto à qualidade literária das obras de Rita Mourão, ninguém melhor para falar sobre “O mundo aos meus olhos” do que meu amigo e crítico literário, Waldomiro Peixoto, que propicia ao leitor de RM um prefácio primoroso, e que esmiúça de forma profunda — como se usasse um bisturi —, os contos e crônicas da obra em questão, e poemas de obras anteriores a ela, como “Chama e mormaço”, publicada em 1997.
Enfim, ver o mundo aos olhos de RM nos permite, ao nos deparamos com notícias e relatos dessa espécie, não sermos mais movidos por somente dois sentimentos —raiva do culpado e indignação pelo sofrimento da esposa — mas sim por múltiplos sentimentos, dada a experiência adquirida com as mulheres de Rita Mourão.
ANTONIO CARLOS TÓRTORO
ancartor@yahoo.com
www.tortoro.com.br

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