LI E GOSTEI : O ADOLESCENTE

ADOLESCENTES  DE HOJE E DE ONTEM

“Por trás de cada atitude impulsiva e imatura da juventude há o desejo de conhecer a verdade: o belo “.

Nem durante minhas férias, deixo de pensar em adolescentes.
No meu trabalho de Orientador Educacional, gosto muito de encontrar adolescentes críticos (sem serem  mal-educados) ,  bem-humorados ( sem serem irônicos) , contundentes ( sem serem agressivos), educados ( sem serem subservientes ), inteligentes ( sem serem pedantes) , alegres ( sem serem infantis), discordantes ( sem baixar o nível da conversa usando termos ofensivos, na falta de argumentos ) e, acima de tudo, curiosos e abertos a ideias diferentes das suas ( que saibam ouvir).
Sempre que posso, e consigo, conversar com um adolescente resolvido, consigo mesmo ( o que é fato raro) , saio da conversa um pouco mais jovem, questionando algumas ideias preconcebidas nos meus mais de sessenta anos, e tenho a certeza de que meu interlocutor sempre sai um pouco mais  amadurecido.
Não os considero “aborrescentes” , a não ser quando, mimados, nas horas vagas, por pais ausentes,  apresentam atitudes infantis e se mostram sempre dispostos a fazer birras somente com o objetivo de confronto com a autoridade, qualquer que seja ela.
E é muito bom quando encontro um deles com uma “ideia”  a ser discutida.
É o caso de Arkádi Makárovitch Dolgorúki, personagem de Fiodor Dostoievski, no livro O Adolescente , escrito há duzentos anos, numa sociedade autoritária em que existia a servidão (uma forma de quase escravidão no campo) e, nas principais cidades da Rússia, do século XIX, a nobreza ainda era a classe dominante. O país era dirigido pelo imperador; ao mesmo tempo, novas propostas de governo e de organização da sociedade
começavam a surgir — o comunismo era uma delas.
A “ideia” de Arkádi  é complexa em sua simplicidade — curiosamente, tem a ver, ao mesmo tempo, com poder, solidariedade e plenitude da alma. Ele pretende ganhar muito dinheiro; mas, quando atingir o objetivo, não ficará preso à fortuna adquirida  — em vez disso, ele a doará inteiramente, visando ao bem da humanidade. Só assim, doando tudo o que ganhar, ele tornará um ser humano verdadeiramente poderoso e em paz consigo mesmo.
Mas, no meio do caminho — uma busca por conhecer o pai (Versílov) , que se transforma em um emaranhado de histórias desconexas, em que cada um parece contar apenas o que lhe é conveniente —, Arkádi descobriu que sua “ideia” tinha um defeito : permitia escapadelas. E chegou a questionar a validade dela : não imaginava que seus desvios custariam muito caro.
Nas 316 páginas de O Adolescente, o leitor encontra o que se escondia no coração de um adolescente que viveu naquela época atribulada: “um achado que não de todo sem valia, já que os adolescentes são a argamassa de uma geração”. Narrado em primeira pessoa, o livro é um relato apaixonado sobre as incursões de um jovem idealista (Arkádi) em São Petersburgo,  pelo mundo adulto e sobre as escolhas que ele deverá fazer a partir de suas crenças (“ideia” ) e das incontingências dessa nova fase da vida.
E vai descobrir que os adolescentes de hoje  não mudaram muito no processo de conhecerem o mundo, como ocorreu com o conhecimento humano  ( adolescente) na Europa do século 18,  — antes  das teorias de Pascal e de Descartes, e dos experimentos de Newton — quando, a humanidade evoluía a partir das tentativas, errando muito e acertando às vezes.

 

ANTONIO CARLOS TÓRTORO70_11379-1

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