ANIVERSÁRIO DE FALECIMENTO DE BEETHOVEN DEGOBBI TÓRTORO

 

BEETHOVEN

(Artigo escrito no dia 10 de fevereiro de 2099)

 

 

“Quando a lua estiver na sétima casa e Júpiter se alinhar com Marte, a paz guiará os planetas e o amor varrerá as estrelas” .

Música “Aquarius”

O meu companheiro inseparável, Beethoven, partiu rumo ao céu dos caninos, quatro dias antes do dia dedicado a São Valentim, nos Estados Unidos, quando a lua, em Libra, entrará na sétima casa de relacionamentos. Nesse momento, Júpiter e Marte estarão alinhados no signo de Aquárius, na décima segunda casa da transformação espiritual.

Tricolor como toda a família, em sua pelagem grossa e espessa, recebia um ossinho diário, mas só ia roê-lo quando eu chegava do trabalho e ele me sorria latindo.

Em minha agenda pessoal, agora passa a ter uma anotação: morreu o “Bê”, em dez de fevereiro de 2009.

O corpo inerte do meu cão, envolto em toalha branca, leva consigo uma história de dez anos, repleta de latidos festivos, lambidas homéricas, olhares coniventes e, nos últimos tempos, um ronronar tranqüilo, característico da velhice, embaixo da cama: refúgio preferido, depois de ficar atrás do meu computador enquanto eu escrevia meus artigos.

Alarme sensível, ninguém se aproximava do portão sem que ele saísse como um tiro, rasgando o espaço do quarto até a sala, em uma tremenda algazarra.

Com sua incontinência urinária, transformaria tudo em ferrugem, não fosse o trabalho constante de envolver com um bom plástico os pés de geladeira, fogão, mesas, cadeiras, portas.

Ao pé da mesa, nos momentos de refeição familiar adorava dividir conosco a carne de frango e os doces.

À noite, debaixo da cama, sentia-se tremendamente agredido se tentássemos observá-lo levantando o lençol: rosnava e latia indignado.

Pela madrugada, qualquer ruído dos gatos no telhado colocava o “Bê” em estado de alerta, pulando e latindo diante da porta fechada, surdo às advertências de minha esposa para que parasse de latir e voltasse a dormir.

Em casa de fotógrafos, composta por minha esposa, meu filho e eu, o “Bê” não gostava de flashes e cliques: fugia das lentes como se fôssemos paparazzi.

Beethoven Degobbi Tórtoro, cão da pura raça TL, membro inesquecível da família Tórtoro, passou mal durante a noite de segunda para terça-feira e se foi, para sempre, por volta das nove horas e trinta minutos de uma manhã ensolarada de verão. Não houve tempo sequer para utilização do seu plano de saúde ou consulta com veterinário.

Inerte, caído na porta da cozinha, acariciei seu pelo, cocei suas orelhas, dei-lhe uns tapinhas na traseira, puxei seu rabo: mas não tive resposta alguma, nem mesmo uma rápida lambida ou olhar carinhoso.

Chorei, chorei e chorei como se chora quando se perde um grande amigo. Minha alma e meu coração ainda vão chorar de mansinho em silêncio e durante muito tempo. A cada volta para casa, sem um latido para me receber, a cada manhã sem uma lambida nos pés antes que as meias sejam colocadas, a cada artigo que começarei escrever, sem ouvir o roer de um osso atrás do computador.

Nunca mais receberei do “Bê” o jornal trazido na boca, logo de manhã, acompanhado de uma saudação caudal esfuziante. Nunca mais ele sairá do meu quarto para a sala do computador, com osso na boca e postura de alguém que cumpriu sua principal missão do dia.

Nunca mais, como dói.

Mas, enfim, o meu cão não era maior e nem menor, mas foi uma constelação de alegria que varreu de amor e paz a minha existência, até mesmo quando Júpiter não se encontrava alinhado com Marte.

 

ANTONIO CARLOS TÓRTORO

ancartor@yahoo.com

www.tortoro.com.br

 

 

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