SENTAR-SE-Á EM MEU COLO

“Ora, na Academia Francesa havia apenas uma poltrona, ou fauteuil, para o diretor. Em 1713, foi candidato um escritor amável, então muito querido, La Monnoye, e o acadêmico cardeal d’Estrées quisera dar-lhe o voto… mas lá, não iria, pois que, príncipe da Igreja, não se sentaria num banco, como a ralé, senão num fauteuil, como tinha direito no paço del-rei. Não haja dúvida, disse Luís XIV, sabendo do caso: «dêem-se quarenta poltronas aos senhores acadêmicos»…
Afrânio Peixoto

Perdi o sono ao receber comunicado de uma academia de letras informando-me que minha fauteuil está vaga — segundo as regras estabelecidas por um novo estatuto — por ser (por motivos que declarei em carta enviada ao presidente, na época do meu afastamento) faltoso e inadimplente.
Fiquei sabendo que não sou mais imortal: “Oh céus! Oh vida! ”
Mas vamos esclarecer.
Não me preocupa que meu nome e meu trabalho realizado durante anos em prol da tal academia, estejam sendo deletados pela atual diretoria: é um direito que não discuto, tendo em vista que, como ex-presidente de uma outra academia de letras, e da ARE- Academia Ribeirão-pretana de Educação, reconheço que uma instituição não vive sem o pagamento das respectivas anuidades.
O que me preocupa é saber quem se sentará no meu colo, na Cadeira no. 8, que ocupei por dezenove anos, a convite de João Pedro Castroviejo — tomei posse dia 28 de outubro de 1992 das mãos dos saudosos Luiz Roberto Marcondes de Oliveira (Presidente) e José Pedro Miranda (Fundador e Secretário) — tendo em vista que não morri (ainda).
Estão comigo, na desova cultural/literária, mais onze ex-acadêmicos (dos quais não menciono publicamente os nomes para não sofrer um possível processo)   — ou seriam ex-imortais ? —, um neologismo que acaba de ser criado.
Destaco quatro, dos onze nomes (não tive a oportunidade de  conhecer os demais) por haver convivido com eles, e saber o quanto se dedicaram à causa da academia por longos anos.
Quanto a mim, guardarei dessa academia, na lembrança,  o momento da minha posse, e as palavras do meu padrinho, Pedro Tarlá, imortal (segundo o antigo estatuto), esteja ele onde estiver: “ Nesta academia onde pontificam ilustres intelectuais, podemos afirmar que o poeta Antonio Carlos Tórtoro é um novo astro em nossa constelação de valores.Ocupando a Cadeira de Padre Euclides Carneiro, honrará a cultura e a dignidade do seu Patrono. Por todos esses motivos, avalizo meu afilhado perante esta egrégia academia que, em boa hora, acolheu, por meio de seu alto conselho, a figura brilhante desse poeta que aqui chega pleno de títulos honrosos, prêmios e livros de poesia, para encantar nossa terra e nosso povo. Tem mais, é o mais jovem acadêmico, que vem fincar neste sodalício um novo tempo. Como um novo sol para brilhar e aquecer o espírito democrático que faz de nossa academia o anti-ranço das entidades fechadas onde a tirania das vaidades jazem no esquecimento”.
Tive, como já declarei, meus motivos para me afastar da academia — e quem assina a ata “descadeirante” de 14/12/2011 sabe bem quais foram eles, pois era o presidente na época do meu afastamento  — e não me arrependo da decisão tomada.
Tenho plena convicção de que a academia e suas diretorias passam, mas tudo que publiquei, assinando como membro da Cadeira no. 8, ficará: essa é a única imortalidade, a literária.
Aguardo em meu regaço virtual o próximo neo-acadêmico, optando, se possível, dado minhas preferências sexuais, por uma  neo-acadêmica.

ANTONIO CARLOS TÓRTORO

 

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