LI E GOSTEI: NADA

70_12693-1O PONTO ÔMEGA E O NADA

“A importância do nada para mim é a possibilidade de transcendê-lo e chegar ao tudo”

Heidegger

É impossível não sentir nada após a leitura de Nada, de Janne Teller.
“É uma perda de tempo — gritou  Pierre Anthon — porque tudo só começa para acabar. Você começa a morrer no instante em que nasce. E isso vale para tudo. A Terra tem 4.6 bilhões de anos, mas vocês chegarão no máximo aos 100 !!! Existir não vale a pena. É tudo um grande teatro, tudo fantasia, fingindo ser o melhor exatamente nisso”.
Quando lançado em 2000, Nada gerou muita controvérsia na Escandinávia, e foi até mesmo temporariamente banido.
Nada é um livro que incomoda qualquer mente sadia que tenha acesso às suas páginas: uma ótima mas , até certo ponto, macabra leitura.
São 127 páginas que li num único dia, durante um feriado em homenagem à Consciência…negra.
O livro conta a história de um grupo de crianças do sétimo ano que — para provarem que Anthon não tinha razão — decidem reunir numa serralheria abandonada uma pilha de objetos que representem algum significado em suas vidas.
A pilha começa com uma coleção de livros de Dungeons & Dragons, uma vara de pescar, um par de tamancos verdes novos e um hamster de estimação. Contudo, com o passar do tempo, os participantes aumentam as exigências e todos se desafiam a abrir mão de coisas ainda mais especiais. A pilha de significados então transforma-se em algo macabro e doentio.
E nessa alegoria sombria e surpreendente, Janne Teller  — nasceu em 1964, na Dinamarca, e mora em Nova York —mostra como, às vezes, os abismos da vida estão dentro de nós mesmos.
Não fosse eu ter sido acudido por Teilhard, as idéias de Pierre — e o questionamento plausível sobre o valor das coisas que insistentemente prejulgamos necessárias e insubstituíveis, inteligentemente conduzidos pela autora —, estariam me atormentado até agora.
Digo isso porque em O Fenômeno Humano, Teilhard de Chardin — jesuíta e paleontólogo, precursor do que foi chamado evolucionismo cristão — afirma que a humanidade segue um processo de centralização e unificação : o Ponto Ômega.Ele afirma que pela primeira vez na história, a humanidade tem consciência de estar sujeita a um processo de complexificação e, portanto, de superação de si mesma, de ultrahominização. O ponto final da hominização é o Ponto Ômega, reconhecido como o centro, o ponto último de convergência no qual o processo de complexificação atinge plena realização.
Logo, não será Anthon, Teller,  e nem um grupo de crianças egoístas e cruelmente perversas que irão me convencer de que tudo em que acreditei até hoje, é nada.
Mas não posso negar que, depois de ler Nada, e somente haver restado uma massa cinzenta da pilha de significados, Pierre Anthon continuará sentado na ameixeira do número 25 da Tæringvej gritando aos meus ouvidos: “Morrer é fácil porque a vida não tem sentido”.
Com significado não se brinca. Certo ?
Então vamos nos divertir.

ANTONIO CARLOS TÓRTORO
ancartor@yahoo.com
www.tortoro.com.br
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