LÁPIS DE COR

Sou noveleiro, e sinto inveja de Bruno, personagem de Thiago Lacerda na novela  “Viver a Vida” : eu também gostaria de viver sem preocupações, rodando o mundo tirando fotos.
Pensei em equipamentos sofisticados, máquinas fotográficas de última geração, e em lápis de cor.
Um presente inesquecível que recebi, e não me lembro de quem, foi uma caixa de lápis de cor: muito provavelmente era produzido pela Johann Faber.
Ela, ao abrir-se ao meio, como se fora um livro, apresentava duas partes, com duas camadas cada uma, de doze lápis: 48 lápis, 48 cores, 48 mundos de beleza e nuances, de degrades, de opções para riscar o papel e criar.
Nem se pensava em existir o photoshop com suas “variations”: more green, yellow, cyan, red, blue, magenta e opções ligter e darker: o mundo, aliás, na minha infância de filho de comerciário, não era nada colorido.
Mas ganhei uma caixa de lápis de cor.
Com ela descobri que existiam diversos verdes, descobri que todas as cores poderiam ser claras ou escuras, descobri que o branco, reunião de todas as outras cores, não servia para nada, e que o preto, apesar de representar a ausência de cor, era o que mais forte deixava suas marcas na página branca e virgem à minha frente.
Aquela caixa era o início, em minha vida, de um pacto com a arte, com a cultura, com o estético, com o belo: era o meu arco-íris particular. Naquela caixa com longos cilindros coloridos, encontrei, pela primeira vez, a maneira de me expressar e de me comunicar com as pessoas por meio da arte, do desenho, num ritual inesquecível de aliança com o sublime, com o intocável, com o místico.
Descobri, depois, na escola, a decomposição da luz via prisma, em sete cores, e sua recomposição inicial num Disco de Newton, e senti que o mundo era feito de cores, apesar de todas as dificuldades e dissabores de uma adolescência pobre, convivendo com jovens abastados, advindos de famílias tradicionais da cidade, no Otoniel Mota.
E agora, componente que sou do Grupo Amigos da Fotografia, ganhei nova caixa de lápis de cor em forma de uma D70, da Nikon, e um programa de computador, o Photoshop: um arco-íris de milhões de cores, à disposição de quem desejar encontrar um pote de ouro ao utilizá-lo.
Desde o início de 2007, com minha caixa de lápis e programa eletrônicos, pintei Carnavais de Ribeirão Preto, pintei o prédio da colônia de férias do Sindicato dos Empregados no Comércio do Estado de São Paulo, pintei cenas das areias da Praia Grande: e transformei tudo isso em exposições abertas ao público ribeirãopretano.
Mas, apesar de todo esse colorido atual em minha existência, chegando aos meus sessenta anos, sinto, às vezes, uma tendência muito forte para voltar ao preto e branco, às origens da fotografia, no século XIX, e às suas primeiras formas que se popularizaram: o daguerreótipo, porque a foto em PB é forte, dramática, rica em nuances e detalhes: é adoravelmente misteriosa e muito mais colorida do que se possa imaginar, tendo em vista que, nos tons de branco, leva todas as demais cores do espectro e, no preto, a ausência total delas.

 

ANTONIO CARLOS TÓRTORO

 

 

COMENTÁRIOS SOBRE O ARTIGO ACIMA:

 
Creio firmemente que a palavra cria e as pessoas têm uma grande responsabilidade quando falam, ou escrevem até mesmo quando apenas pensam pois podem construir e destruir com a palavra.
Sobressai, nas tonalidades com que você “pinta” as suas experiências, a figura do eterno semeador de construção, do constante mestre.
É muito bom sabê-lo sempre semeando construção pelo mundo afora.
Cel. Sebastião Alberto Corrêa de Carvalho.

 

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