LI E GOSTEI: DO FUNDO DO BAÚ

JUGURTA: NOSSO BOLDRIN

“Quando embarco nas minhas recordações, remexo tão fundo no baú, que até eu mesmo fico espantado ao ver quanta coisa está guardada  lá”.

Jugurta

Quem conhece o mineiro de Cássia, Jugurta de Carvalho Lisboa, sabe que ele lembra boteco, cerveja, caipirinha, “tira-gostos”, petiscos baratos e uma conversa sem compromisso.
Jugurta também lembra Rolando Boldrin, compositor, cantor, ator e apresentador de TV que é conhecido por esse Brasilzão com o rótulo do qual se orgulha: um contador de causos, dos “bão”.
É sempre bom encontrá-lo e compartilhar sua expressão de menino travesso, gestos tão largos quanto o sorriso, abraço apertado de quem parece encontrar alguém que há muito tempo não vê: JC é um jovem de oitenta anos.
Melhor ainda é ler JC.
A leitura de seu Do Fundo do Baú, faz transbordar nosso baú particular de memórias, com novas histórias, novos personagens reais, novos termos e expressões regionais, porque, em cada texto, como escreve Adriana Silva, na orelha do livro: “…a conexão se estabelece, envolvendo o leitor, o escritor e o personagem”.
As situações que emanam de seus causos impregnam nossa mente como o hálito de Zé Paraíba: depois de ler JC,  fica difícil ouvir causos, de quem quer que seja, sem se lembrar da Literatura Testemunhal desse mineirinho que plantou raízes num paraíso criado pelo Grande Arquiteto na divisa entre Ribeirão Preto e Jardinópolis.
JC é um Dante que durante sua vida passou por paraísos, purgatórios e infernos, em terras de Minas, São Paulo e Rio de Janeiro  — mas diferente do Alighieri, teve a felicidade de poder dividir seus dias com uma Beatriz especial, minha amiga/irmã Ely Vieitez Lisboa — e traduz  essa mina de experiências vividas em quarenta histórias que “desnudam lugares, épocas, culturas e tradições”.
Como diz no prólogo, meu amigo/irmão Waldomiro Peixoto: “A simplicidade para se expressar e a síntese ao condensar um mundo exuberante em pequenas histórias, são a principal marca de estilo de JCL”.
Sabedor que sou de que há uma necessidade de cada um de nós —  nesses tempos de solidão, de átomos, de fragmentos, de rapidez, de indivíduos, de descontinuidade, numa era tecnológica da imagem — de encontrar uma voz, a voz de um narrador ecoando transformada e transformadora, li o livro de JC como se o ouvisse contá-las em um rancho de beira de rio,  rodeado de amigos,  à luz de um lamparina a querosene, e o som de uma viola chorosa,  intercalando capítulos.
Do Fundo do Baú é o primeiro passo literário de JC que promete abrir caminho para novas investidas no campo da literatura, pois, segundo o autor : “quando pensei que a estrada tinha terminado, o horizonte mostrou-me que a caminhada estava apenas começando”.
E está.

ANTONIO CARLOS TÓRTORO
ancartor@yahoo.com
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