SOLDADOS VIVOS DA BATALHA QUE NÃO É DE WATERLOO

IDOSO-SOLDADOS“Embora possa ser demasiado sentimental para alguns, Coccon, o conto sobrenatural de Ron Howard da eterna juventude é suave e reconfortante”.

Rotten Tomatoes

Recentemente quase dois séculos depois da derrota de Napoleão Bonaparte em Waterloo, no território da atual Bélgica, arqueólogos encontraram o esqueleto completo de um soldado morto no célebre campo da Batalha de Waterloo.
“Ele parece morrer diante de nossos olhos”, disse o arqueólogo Dominique Bosquet, referindo-se ao esqueleto desenterrado na semana passada durante trabalhos de restauração do local, situado cerca de vinte quilômetros ao sul de Bruxelas.
Eu penso o mesmo que Bosquet ao olhar para os meus velhos pais, octogenários, e para alguns amigos que conheci há décadas em antigos empregos, encontros sociais ou ocasionais.
Dizem que o papel, por ser um material orgânico, acaba sendo biodegradável e demora de 3 a 6 meses para se decompor. Um pedaço de tecido orgânico como o de algodão demora 6 meses a 1 ano. Um simples filtro de cigarro demora 5 anos. .Um chiclete demora 5 anos. Um pedaço de madeira pintada demora 13 anos. Um pedaço qualquer de náilon ou tecido baseado nele demora 30 anos para desaparecer. Um pedaço qualquer de plástico vai durar 100 anos na terra sem se decompor. Um pedaço de metal demora mais de 100 anos. Um pedaço de borracha fica por tempo indeterminado. Uma garrafa de vidro vai demorar 1 milhão de anos para desintegrar. O saco plástico que você pega no supermercado e depois joga no lixo ficará na natureza por 450 anos.
E eu, diante do espelho, e dos meus mais de sessenta e cinco anos, observo minha degradação passo a passo, no decorrer de cada ano, e concluo que serei pó muito antes do que qualquer pedaço de borracha, saco plástico ou garrafa de vidro.
Assim , diante da realidade física e palpável, fica difícil acreditar que o ser humano faça parte, segundo Teilhard de Chardin , de um processo evolutivo que possui um sentido que culminará no que ele chama ponto ômega: momento que toda a natureza retornará a Deus e todos os homens, enquanto pessoas, promoverão a união no hiperpessoal por meio da energia do amor…
Lindo, um sonho fantástico, mas somente um sonho quando me deparo com carnes em decomposição, peles quebradiças de papel celofane usado, ossos debilitados, enormes manchas negras espalhadas pelo corpo, passos trôpegos, memórias enfraquecidas, olhos sem vida, vida sem sentido.
Na minha idade madura — num tempo em que eu ainda não conhecia de perto o poder destrutivo da velhice — encantei-me com o filme Cocoon em que um grupo de extraterrestres chega à Terra com a missão de resgatar alguns casulos com seres de outro planeta e que estão depositados numa piscina abandonada. Sem desconfiar de nada, três velhinhos de um asilo próximo utilizam a piscina. Como a água da piscina está energizada para conservar os casulos até que os ETs consigam removê-los todos, os velhinhos passam a sentir-se rejuvenescidos e com grande disposição. Quando descobrem a razão do que está acontecendo, decidem ajudar os extraterrestres a cumprirem sua missão.
Ao cruzar com alguém com mais de oitenta e cinco, pelas ruas ou tela da TV, fico com inveja de Teilhard por ter ele conseguido ver o Fenômeno Humano nos mesmo seres humanos em que vejo somente sobreviventes destroçados, perambulando sem objetivo, e que parecem morrer diante de meus olhos, vítimas de uma guerra terrível e traiçoeira chamada vida.
Fico esperando por ETs.

ANTONIO CARLOS TÓRTORO
ancartor@yahoo.com
www.tortoro.com.br

ARTIGOS