“No princípio criou Deus os céus e a terra”.
GÊNESIS
E disse Deus no terceiro dia: Ajuntem-se as águas debaixo dos céus num lugar; e apareça a porção seca; e assim foi.
E chamou Deus à porção seca Terra; e ao ajuntamento das águas chamou de Praia da Vila Mirim – Praia Grande – SP; e viu Deus, e nós também, que isso era bom, muito bom.
E lá fomos nós — Lu, minha esposa; Rod , meu filho; e eu — no início de dois mil e quinze, usufruirmos dessa obra divina por seis longos dias de uma rotina estafante: acordar às sete, tomar reforçado café da manhã, pular ondas sob um sol escaldante de verão, para depois tomar caipirinha, cerveja gelada, comer camarão, voltar para o paraíso proporcionado pelo Centro de Lazer dos Empregados do Comércio do Estado de São Paulo, e mergulhar na piscina refrescante, almoçar tomando sucos de frutas servidos pelo simpático trio da cantina — José, Guilherme e Lucas —, dormir por duas horas, tomar uma sauna relaxante, voltar à praia para curtir um picolé e ler algumas páginas do 1Q84 de Haruki Murakami, retornar à piscina, jantar, ir para a cama ver TV e…dormir exausto.
Mas para quebrar a monotonia, nas areias da Praia Grande existe uma barraca, a da Linda, para onde parecem caminhar, todas as manhãs, em procissão ao deus Netuno, pranchas de surfe, cangas multicoloridas, bicicletas, praieiros, turistas, cadeiras, guarda-sóis, pipas, tudo para satisfação de pequenos prazeres do corpo e da alma: É o lugar mais sagrado do pedaço de areia que divide Cidade Ocian de Vila Mirim onde a orla sorve goles de um mar espumante em eterno réveillon.
Passar o dia nos arredores dessa barraca — a mais aconchegante do litoral paulista — é parte de um ritual que sinto necessidade de cumprir, pelo menos uma vez a cada ano, a fim de recuperar energias necessárias e suficientes para realização do meu trabalho de educador mesmo tendo, às vezes, que dar uma chegada forçada ao Quietude — Posto de Saúde onde todos procuram curar as costumeiras diarréias e vômitos com doses de Bromoprida e Leiba comercializadas pela simpática atendente da Farmacintra à beira-mar.
Ainda na famosa barraca,um trio de anjos da guarda — Linda, Gilmar e Regina — zelam, sempre com sorrisos cativantes, pelo bem estar de quem tem a felicidade de encontrá-las na beira do mar, seja sob sol escaldante, ao sabor da brisa suave e refrescante, ou mesmo quando as nuvens ameaçam invadir terra e mar expondo somente espectros que vagam pela areia ou, teimosamente, se banham no mar em extrema ebulição de ondas.
Visitar diariamente e saudar a enorme escultura de Iemanjá, e estar com Linda e sua inseparável simpatia é sentir a satisfação inexprimível de poder voltar, mais uma vez, ao mar da Praia Grande, tendo a oportunidade de encontrar amigos que a distância, e os trezentos e sessenta e cinco dias do ano, não conseguem apagar da memória.
Ao sabor da batatinha frita, ou do camarão a milanesa, dando goles na cerveja gelada depois de abrir o apetite com uma caipirosca, nada é mais prazeroso do que ficar poetando ao ritmo das ondas — ou não pensando em nada — ouvindo o eterno ribombar monótono do mar, somente quebrado pela presença de buzinas de vendedores ambulantes, gritos de crianças besuntadas de protetores solares e revestidas de areia, ou pelo ruído característico do helicóptero dos bombeiros expulsando veranistas mais afoitos que enveredam mar adentro.
E enquanto Deus descansou no sétimo dia, também no sétimo dia consecutivo de sol, qual Anchietas do século XXI subimos a Serra do Mar — sob o comando de Rita, eficiente e simpática guia — rumo a Ribeirão Preto, no Marcopolo da Rápido D’Oeste, para mais um ano letivo de muito trabalho a fim de podermos pagar os novos impostos recriados pelo governo Dilma, e a fim de tentarmos cobrir os rombos nos escândalos de corrupção : petrolão, mensalão, BNDESalão e similares.
ANTONIO CARLOS TÓRTORO
ancartor@yahoo.com
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