LI E GOSTEI: 1Q84 – VOLUME II

CAPA-1Q84-VOL-II

1Q84: NÃO É AUTO AJUDA

Devorei o primeiro volume.
Devorei o segundo.
Estou falando do livro de Haruki Murakami, 1Q84.
Mas quase perco a vontade de ler o terceiro volume quando:
Aomame, na página 352 do volume I, aperta o gatilho de sua arma colocada dentro da boca; e depois, no início do volume III, página 29, leio: “Mas (Aomame) acabou não puxando o gatilho”.
Erro do autor ?
Não.
Simplesmente ficção de Murakami.
“Se você não consegue entender alguma coisa sem receber explicações, significa que continuará não entendendo, apesar das explicações” diz a jovem escritora Fukaeri, repetindo o que ouviu do pai dela.
E é assim 1Q84: as coisas não precisam ser explicadas…e nem devem ser.
É pura diversão, puro deleite, envolvente: e com duas luas.
Mas, para o leitor mais atento, o próprio Haruki coloca nas considerações de Aomame (personagem principal, juntamente com Tengo, de 1Q84) ), feitas sobre o livro, A Crisálida de ar, após sua leitura, como deve ser interpretado seu romance 1Q84.
Pois vejamos.
“Crisálida do ar termina simbolicamente, quando ela (a menina de 10 anos da história) está para abrir a passagem (por onde passa o Povo Pequenino). Não conta o que acontecerá depois. Possivelmente porque ainda não aconteceu. Sem dúvida o que de mais fascinante havia nesse romance (A Crisálida de ar) eram as descrições vívidas e precisas. Era uma história fictícia de alguém que vivia num ambiente especial, com poder de suscitar a simpatia das pessoas. Parecia despertar algo do subconsciente, compelindo-as a prosseguir ininterruptamente a leitura”.
Eis o objetivo de Murakami em 1Q84: transmitir algumas informações vitais de forma simbólica, deixar a história em aberto para que o próprio leitor tire suas particulares conclusões, descrever minuciosamente (às vezes de forma por demais repetitiva) as situações e momentos envolvidos no enredo, passar para o leitor a visão especial de mundo que habita a mente de um escritor de ficção, despertar algo no subconsciente de cada um de nós impedindo-nos de largar as páginas dos três volumes de 1Q84 antes do último parágrafo.
É assim, por exemplo, a história da cidade dos gatos, que Tengo leu durante uma viagem que fez para visitar seu velho pai em uma casa de repouso: “Mas na verdade, aquela era uma cidade de gatos. Ao anoitecer, muitos atravessavam a ponte de pedra, de volta para a cidade. Gatos de vários tipos e cores. Eram bem maiores que um gato normal, mas não havia dúvidas de que eram gatos . Os gatos agiam com a maior naturalidade: alguns abriam as lojas enquanto outros começavam a trabalhar na prefeitura, ocupando suas mesas de trabalho. Eles faziam compras nas lojas e comiam nos restaurantes locais. Os gatos tomavam cerveja no bar e cantavam e outros dançavam ao compasso da música. Ali era um lugar em que as pessoas se perderiam. Um lugar preparado e que não existia nesse mundo. O trem ( que passava pela cidade) jamais pararia naquela estação para levar alguém de volta ao mundo de onde viera”.
Penso que é assim que o autor espera que seja lido seu romance 1Q84: quando forem conhecidos e interpretados seus encantos e magias, nunca mais será possível esquecê-lo.
Enfim, 1Q84 não tem respostas prontas: não é um livro de auto ajuda.
Mas se não consegui me fazer entender sobre o que penso sobre 1Q84, desisto: “Se você não consegue entender alguma coisa sem receber explicações, significa que continuará não entendendo, apesar das explicações”.

ANTONIO CARLOS TÓRTORO
ancartor@yahoo.com,
www.tortoro.com.br

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