LI E GOSTEI: O UNIVERSO, OS DEUSES, OS HOMENS

A MITOLOGIA E EUCAPA-O-UNIVERSO-OS-DEUSES-OS-HOMENS

No início da década de setenta, a Editora Abril lançou uma coleção em fascículos semanais que viriam a compor três volumes: Mitologia.
Naquela época, nos meus vinte e cinco anos, solteiro, nas manhãs de domingo eu ia até a Agência São Paulo para adquirir, ler e me deliciar, gota a gota, com o néctar da cultura Greco-latina: um momento de me alimentar espiritualmente de uma ambrosia cultural.
Esse material — um patrimônio mítico-poético da cultura Greco-romana, que tanto influiu e vem influindo na literatura, filosofia, escultura, teatro, pintura e cinema — foi o primeiro contato que tive com os mitos gregos: e fiquei encantado.
Agora, já sexagenário, acabo de ler O Universo, os deuses, os homens,
de Jean-Pierre Vernant, um livro que nos permite penetrar nas histórias que Platão chamava de “fábulas de ama de leite”, no qual o autor combinou a filosofia com estudos de história, antropologia e lingüística e, com esse enfoque multidisciplinar dos mitos, promoveu uma renovação profunda no modo de interpretar a Grécia antiga.
É muito interessante, por exemplo, um detalhe significativo do mito de Prometeu: “ Há o tempo dos deuses, a eternidade em que nada acontece, tudo está lá, nada desaparece. Há o tempo dos homens, que é linear, sempre no mesmo sentido, pois o homem nasce, cresce, torna-se adulto, envelhece e morre. Há por fim, um terceiro tempo, apresentado pelo episódio do fígado de Prometeu. É um tempo circular ou em zigue-zague. Indica uma existência semelhante à da lua, por exemplo, que cresce, morre e renasce, indefinidamente. Esse tempo prometeico lembra o movimento dos astros, isto é, esses movimentos circulares que se inscrevem no tempo, que por seu intermédio permitem medir o tempo. Não é a eternidade dos deuses, não é tampouco o tempo terrestre, o tempo mortal, que segue sempre na mesma direção. É um tempo do qual os filósofos poderão dizer que é a imagem móvel da eternidade imóvel”.
Pensei nos ciclos da reencarnação.
Também achei interessante a conclusão do autor com relação ao enigma da Esfinge que Édipo decifrou: “Quando estamos na fase dos dois pés somos alguém cujo prestígio e força se impõem mas, desde que entramos na velhice (fase dos três pés) , deixamos de ser o homem da façanha guerreira, tornamo-nos, na melhor das hipóteses, o homem da palavra e do conselho sábio, na pior, um detrito lastimável”.
Pensei comigo: nos meus sessenta e cinco anos espero um dia não vir a ser um detrito lastimável.
Nesses tempos de insegurança identifiquei-me com Epimeteu: “ Nós, pobres e infelizes mortais, somos sempre, a um só tempo, prometeicos e epimeteicos, previmos, fazemos nossos planos, mas volta e meia as coisas se passam contrariamente às nossas expectativas, surpreendendo-nos e nos deixando indefesos”.
Para finalizar, não pude evitar de ver, na luta entre Zeus e Tífon, uma luta minha, particular: “ A luta de Tífon contra Zeus é a luta do monstro de centenas de olhos flamejantes contra a fulgurância do olhar divino. Evidentemente, é o olho fulminante de Zeus que, graças à luz que projeta, vencerá essas chamas lançadas pelas cem cabeças de serpentes do monstro, Olho por Olho, Zeus é o vencedor. No final, mais uma vez Tífon é derrotado. Os nervos de seus braços e pernas que nele encarnam a força vital no que tem de combativo, são vencidos pelo raio. Ei-lo paralisado, os rochedos caindo em cima de Tífon; ei-lo sendo levado de volta ao Tártaro nebuloso, onde se encontram suas origens”.
Atualmente conto com raios, não de Zeus, mas de um acelerador linear PRIMUS da SIEMENS, para destruir um Tífon em forma de tumor maligno.
Enfim, os contos mitológicos continuam atuais.

ANTONIO CARLOS TÓRTORO
ancartor@yahoo.com
www.tortoro.com.br

ACADEMIAS, ARE-Academia Ribeirão-pretana de Educação, ARL- ACADEMIA RIBEIRÃOPRETANA DE LETRAS, ARTIGOS, Li e gostei, LITERATURA