NÃO CALEM A BOCA

“O canto orfeônico(música) praticado pelas crianças e por elas propagado até os lares, nos dará gerações renovadas por uma bela disciplina da vida social, em benefício do país, cantando e trabalhando/estudando , e, ao cantar, devotando-se à Pátria”
Villa-Lobos

No romance Ribamar, de José Castello, Prêmio Jabuti 2011, o autor escreve: “Quando lemos, emprestamos a voz ( a mente) a alguém. Somos um instrumento — como a lupa, o ancinho, o oboé. De posse de nossa voz ( de nossa mente) , o autor fala. Não passamos de um intérprete.”
Fico pensando: e quando cantamos ou ouvimos cantar  ?
Ao ouvir os versos do Hino do Colégio Anchieta ecoando pela quadra de esportes, navegando no mar de vozes infanto-juvenis, meu coração e alma  se transformam em caixas de ressonância: são meus versos ganhando vida:

“Seremos jovens todo tempo ! /  Jesuítas em nós presentes, /  nas praias de um novo milênio, / faremos versos envolventes !  /  Serão versos de amor e paz /  rimando com educação.  /  Serão poemas grandiosos /  compostos com o coração.”

A emoção desliza morna pelo rosto sexagenário. Disfarço e limpo os óculos na camiseta com mensagem de Paz: é dia de Cantata de Natal, e meu presente são as vozes de centenas de crianças e adolescentes:
“Para sempre serão lembrados  /  momentos de fraternidade /        vividos com adolescentes /  que em nós buscaram a verdade.  / Com sabor de grande família  / fonte viva de luz, conhecer,  /  o Colégio Anchieta recende  /            odor do mais nobre saber.”

“A vida sem a música é simplesmente um erro, uma tarefa cansativa, um exílio” — nos confessa o filósofo alemão Nietzsche: mas uma vida na qual é permitido ouvir, cantados, na música de Karen Scott, os próprios versos é magia fantástica.
“Parceiros somos de uma época.  /  Fazemos tudo com ardor. /         Somos cúmplices do momento;  /  Profetas pregando amor. /  Abraçamos com fé a causa.  /  Vivemos só para servir !  /  Somos o portal mais seguro;  / Janela aberta ao porvir.”

Experimentar a emoção de alguém, de um grupo que canta — versos que escrevi pinçados nos espaços mais recônditos de minh’alma — , também emocionado por ouvir sua voz, expressar seus sentimentos, entrar na música deixando-a entrar em si, é algo que não cabe em palavras, que vai além da Terra e alcança o infinito, levado pelo refrão:

Nosso Colégio Anchieta  / Anchieta, poeta e professor. / ‘Ó valoroso esquadrão !  Ó gente vitoriosa ! /  Ó vitória gloriosa !’  /  Ser nessa Escola educando !  /  Ser nessa Escola educador !

No livro Ribamar, a música de ninar, cantada pela mãe do narrador, José, Cala a boca, é a espinha do livro: “Romances devem ter um esqueleto, ou desabam. Pois o livro que escreverei terá uma melodia como suporte”.
Relendo Eça de Queiroz, que já afirmava: “ São os hinos que fazem as revoluções”, tomo a liberdade de pedir aos educandos que passaram pelo Colégio Anchieta, e que aprenderam a cantar o Hino acima, que não se calem, pois os valores nele contidos são a espinha de uma nova sociedade que almejamos.

ANTONIO CARLOS TÓRTORO

 

BOCA

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