MIOSÓTIS E O PATACÃO

 

“Nem sempre uma rosa é uma rosa é uma rosa”

Num álbum de figurinhas, Alice no país das maravilhas, da Editora Vecchi, publicado em setembro de 1958, logo na primeira página temos um coelho vestido de homem, trazendo nas mãos um enorme relógio, e com muita pressa de chegar.
Correndo atrás dele, vai Alice, perguntando aonde poderia um coelho chegar tarde. O bichinho responde que vai para uma reunião importante…
Enfim, nosso coelho entrou num buraco que se abria aos pés de uma árvore gigantesca, e Alice o viu desaparecer.
Meus caros leitores, posso garantir que o relógio que o coelho levava era o mesmo “patacão” que meu pai usava para me distrair quando eu ficava doente, de cama: um relógio de bolso Record Watch Co. Geneve.
O tic-tac acompanhava o ritmo do meu pequeno coração agitado pela febre alta, e, como num passe de mágica, ajudava na ação do antitérmico: pronto , mais um milagre do Geneve, que não sei mais onde se encontra: talvez num buraco qualquer da árvore de minha vida.
Por esse motivo, um “patacão” não é para mim um simples relógio de bolso, é um símbolo que me remete à infância, que me faz lembrar de meu pai ainda jovem (hoje octogenário) , preocupado com minha saúde, no único quarto de uma modesta casa na Vila Seixas: e os encontros com o patacão foram muitos e inesquecíveis.
É o mesmo que ocorre, por exemplo, com o miosótis, uma mimosa florzinha azul que se tornou um sinal de fraternidade — substituindo o óbvio Compasso e Esquadro entre os maçons da GL Alemã do Sol, na clandestinidade, durante o período da 2ª Guerra Mundial — e que, ainda hoje, é o símbolo mais usado pelos maçons alemães, sendo que, em muitas Lojas, o miosótis passa de Mestre para Mestre, permanecendo como símbolo de uma história de honra, fraternidade,  liberdade e  amor perante a adversidade da arrogância, a força da prepotência de Hitler e do nazismo a partir de 1934, na Alemanha. Podemos dizer que ela sempre exteriorizará um exemplo de força, de luta, de sobrevivência, um ato de guerrilha por ideais, um dote de liberdade para futuras gerações de maçons livres.
Todos sabemos que uma das coisas que distinguem o homem dos animais é a capacidade humana de simbolizar. Religião, ciência, misticismo e mitologia também fazem uso de símbolos, bem como sonhos, alegorias, contos de fadas e rituais. Um templo sagrado não apenas contém símbolos, mas é ele próprio um símbolo.
Uma montanha ou uma escada podem simbolizar ascensão ao Cósmico, assim como uma esfera ou bola pode representar o mundo, o universo, ou o todo. Também um livro pode simbolizar conhecimento, e uma corrente ou uma escada podem representar a hierarquia da Criação.
Assim como um miosótis pode significar a persistência na luta por ideais, a lembrança de um “patacão” significa para mim, nos meus sessenta e dois anos, os primeiros contatos com o tempo de minha vida, que nunca mais parou de correr como um coelho agitado, rumo a um compromisso inadiável com o Grande Arquiteto, seguido por uma Alice/Cronos que insiste em me devorar.

ANTONIO CARLOS TÓRTORO

 

 

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