“A necessidade do bode expiatório sacrificial está implantada na psique humana, originária da tentativa de formar uma comunidade durável na qual a vida moral pode ser buscada com sucesso”.
René Girard
Está escrito na Torá, que dois bodes eram levados, juntamente com um touro, ao lugar do sacrifício, como parte dos Korbanot do Templo de Jerusalém. No Templo, os sacerdotes sorteavam ao azar um dos bodes. Um era queimado em holocausto no altar do sacrifício, com o touro. O segundo tornava-se o bode expiatório, pois o sacerdote punha suas mãos sobre a cabeça do animal e confessava os pecados do povo de Israel.
Posteriormente, o bode era deixado ao relento na natureza selvagem, levando consigo os pecados de toda a gente, para ser reclamado pelo anjo caído Azazel.
Diante da crise instaurada no Senado, ouvi por diversas vezes afirmarem que Sarney está servindo como bode expiatório.
Até certo ponto estão corretos os que assim afirmam porque sabemos que nem só de Sarney vivem as falcatruas do congresso, e não condenam o presidente da Casa porque a grande maioria tem o chamado rabo preso.
Roger Scruton — filósofo e professor de pesquisas do Instituto para as Ciências Psicológicas – Virgínia — em seu artigo “O sagrado e o humano” , diz que: “ o bode expiatório é a forma da sociedade de recriar a “diferença” e portanto se restaurar. Ao se unirem contra o bode expiatório, as pessoas são libertadas de suas rivalidades e reconciliadas. Por meio de sua morte, o bode expiatório purga a sociedade de sua violência acumulada. A santidade resultante do bode expiatório é o eco de longo prazo do temor reverente, do alívio e da religação visceral à comunidade que foi experimentada com sua morte” .
No caso do congresso nacional ( assim mesmo, com minúsculas ) nem a teoria de Roger Scruton funciona , pois vejamos :
Alguns senadores ficaram libertados de suas rivalidades e foram reconciliados, tudo em favor, e não contra, o bode de bigode , e em nome da governabilidade: Collor, Sarney , Zé Dirceu, Renan , Lula e muitos outros, no mesmo saco.
Sabemos também que, se supuséssemos possível a morte do bode Sarney — que é impossível porque o conselho de ética não sabe o que é a tal ética — mesmo assim não seria purgada a sociedade de sua violência acumulada: em primeiro lugar porque temos um rebanho de bodes que não seriam sacrificados e , depois, um animal com tamanho capaz de carregar o pecado desse pessoal do senado , já está extinto: seria necessário um dinossauro, um dinossauro expiatório.
Enquanto isso, o povão fica vendo Caminho das Índias, encantado com a vitória de Puja , a intocável, nas eleições : seria ela um Lula de saias , que depois de uniria a Opash , homem de casta , para salvar a vaca expiatória ?
Baguan Keliê !!!
ANTONIO CARLOS TÓRTORO
COMENTÁRIOS SOBRE O ARTIGO ACIMA :
Escrevendo por parábolas Tórtoro traça um perfil realista da política brasileira. Assim, revela que não é apenas um cronista social mas, também, para nosso deleite um ótimo cientista político.
Quinta-feira é dia de Tórtoro.
Felizes somos nós, seus leitores e admiradores.
Corauci Sobrinho – Secretário da Cultura de Ribeirão Preto em 2008
Amigo Tórtoro,
mais uma vez parabéns por seus artigos.
Realmente revendo a história não só de nosso país,mas desde os primórdios da civilização, em todos setores:políticos,religiosos, sociais e educacionais há sempre “um bode expiatório”.
Fazendo uma reflexão sobre o setor educacional,somos nós os educadores respon- sáveis pelo analfabetismo e falta de cultura de nossos jovens.
Sendo mais concisa:alguém se culpa pela progressão continuada,traumatiza… os alunos a reprovação.
O governo dorme “em berço esplêndido “.
Incomoda aos dinossauros governamentais jovens politizados, conscientes de seus direitos.
Viva a pátria nostra.
Quando deixaremos de ter em nossa sociedade o tão satisfatório”bode expiatório?
Abraço fraterno.
Isaura Rodrigues Jorge