SINDROME DE HANNIBAL

 

 

36-hannibal“Na fase oral, ou fase da libido oral, ou hedonismo bucal, o desejo e o prazer localizam-se primordialmente na boca”.

 

Sigmund Freud
Em cada final de bimestre, a maior dificuldade para os educadores é esperar pelos pais que não conseguem alguns poucos minutos para se dedicarem à vida escolar de seus filhos.
Enquanto os pais não têm tempo para os filhos — uma reclamação feita por jovens no programa da Globo,  Profissão Repórter, com Caco Barcellos, sobre o  tema : Escola de Periferia  — eles sempre encontram maneiras de chamar a atenção: não estudam, refugiam-se em seus quartos acompanhados da TV, do computador e do celular, seus, quase inseparáveis, companheiros de solidão.
Quando se encontram, trocam tapas, chutes, ofensas, puxões de cabelo, correm uns atrás de outros, derrubam refrigerantes, jogam rolos de papel higiênico dentro das privadas, fazem guerra de  papel toalha embebido em água, gostam de zoar com tudo e com todos.
Nas salas de aula conversam até serem chamados à atenção, jogam aviões de papel, pedaços de borracha e de lápis, destroem carteiras com tesouras e estiletes.
No MSN e Orkut, ofendem colegas, xingam professores, divulgam fotomontagens, criam falsos perfis e comunidades racistas, ofensivos às minorias.
Sozinhos pulam do alto das escadas, gritam palavrões pelas janelas, roubam pequenos objetos de mochilas, furtam de dinheiro a celulares.
E agora os jovens estão se mordendo.
João morde o rosto de Maria , que morde o pescoço de Irene, que morde o braço de José , que morde, que morde, que morde.
Por enquanto não chegaram a arrancar pedaços, como o personagem de Thomas Harris, cuja obra foi retratada no filme O Silêncio dos Inocentes, mas deixam marcas avermelhadas, arroxeadas: parecem querer deixar no corpo dos amigos a mesmas marcas que pichadores deixam nos prédios e muros, para demarcarem espaços.
Parece uma forma estranha e assustadora de dizer: eu estou aqui.
Tenho a impressão de que, por falta de comunicação adequada na infância, fixaram-se na fase oral, manifestando-se esse fato, durante a adolescência, na forma de jovens dependentes,  ou que, em outras palavras, precisam empregar a força e a astúcia para conseguirem o que desejam, inclusive o amor e a atenção de seus pares nas relações que querem estabelecer no ambiente escolar, pois vejamos : “Na criança de mais ou menos um ano, a ansiedade causada pelo início do complexo edípico, toma a forma de um temor de ser devorada e destruída. A própria criança deseja destruir seu objeto libidinoso, mordendo-o, cortando-o e devorando-o, o que provoca ansiedade, já que o despertar das tendências edípicas é seguido pela introjeção do objeto, que se transforma em alguém de quem se deve esperar um castigo. A criança teme um castigo que corresponda à sua ofensa: o superego se transforma em algo que morde, corta, devora. (KLEIN, 1981, p. 254)”.
Enfim, como afirma Maria Beatriz Jacques Ramos, da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, “o passado deles se expressa no sintoma, mostra-se nos atos, emoções e relacionamentos. O traumático é carregado de afeto, a pulsão de morte afasta o outro, tira-lhe o significado, produz desligamento. Nisso, reside a severidade do superego kleiniano, a hostilidade voltada contra si mesmo e o outro. Amor,  ódio e agressão constituem a vida mental; os estados mentais, as defesas conservadoras”.
Só resta aos educadores, no dia-a-dia, trabalhar com essa realidade cruel que nos foi legada pela pós-modernidade, pela revolução industrial, pela globalização, deixando a explicação para psicólogos e psiquiatras — se é  que terão  tempo  com seus consultórios abarrotados de desajustados — após  estudos mais aprofundados.
Klein ou Freud explicam ?

 

ANTONIO CARLOS TÓRTORO

 

COMENTÁRIOS SOBRE O ARTIGO ACIMA:
Já começo a ter os meus melhores pensamentos de paz e serenidade, para aqueles jovens sem condição de auxílio psicológico, para que não se tornem futuros adultos desajustados nessa nossa sociedade tão necessitada de educação, em todo seu contexto.
Abraços.

Família Freitas

 

Caro Professor e amigo:
seu artigo é uma fotografia perfeita da realidade sócio-educacional de nossas crianças e adolescentes.
Coloca o dedo na ferida e mostra a verdade que muitas autoridades preferem ignorar ou esconder.
Parabéns por sua coragem e transparência.

Abraços,
Ex-Deputado Federal Corauci Sobrinho

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