“Se eles (dentes) caem, indicam doença ou falecimento de alguma pessoa próxima”.
Significado dos sonhos
Acordei com sentimentos aziagos: sonhei que meus dentes incisivos amoleciam e saíam em minhas mãos, sem dor, sem motivo, e me vi, num espelho, terrivelmente desdentado.
No Colégio, por volta das sete horas e poucos minutos, não vi, como de costume , passar pela porta de minha sala, rumo à secretaria, o Emerson da cantina.
Ele sempre me chamou de Professor: nunca de Tórtoro, Antônio Carlos ou Toninho, como costumam me chamar meus alunos desde a época de Colégio Metodista, depois Santa Úrsula e, agora, Anchieta.
De poucas palavras, mas sempre educado e atencioso, constantemente trocamos cumprimentos pelos corredores e pátio do Anchieta, e , às vezes, em alguns momentos de tranquilidade — poucos num colégio com quase setecentas crianças e adolescentes — eu me sentava com ele e “filosofávamos” por alguns minutos sobre as atividades no colégio, as histórias de alunos e professores, os mais recentes fatos do futebol e da política, sentindo a brisa da manhã no rosto e olhando para as árvores tomadas por barulhentos e agitados pardais, micos-estrela, rolinhas , periquitos e até, num certo dia, por um tucano.
Numa das últimas vezes, pela janela, perguntei, meio que apressado, sobre seu pai, já idoso e adoentado, pescador dos mais antigos, que não frequentava mais o Clube de Regatas.
Emerson também era o meu fornecedor assíduo de pão de queijo cru, congelado : era só pedir , e ele providenciava o pacote para levá-lo ao meu filho, um devorador do mineiro petisco.
Nosso último encontro foi em minha sala de Orientador Educacional onde, por quase duas horas, entrevistei alunos, sob seu olhar atento e, como sempre, calado, sobre um ocorrido na cantina que ele dirigia: depois disso, não o vi mais.
Ficará a lembrança de um amigo, com o qual eu nunca tive grande convivência, mas que fez parte de minha vida profissional naquilo que ela sempre teve de mais importante: a convivência com alguns seres humanos especiais — Emerson Sgobbi era especial pelo seu porte europeu, pela moto que usava, pelo aparente — nos seus quarenta e oito anos —, descomprometimento juvenil, pela educação, pela especial deferência com que tratava as pessoas de seu convívio profissional, desde crianças até os adultos.
Vou dormir, hoje, com sentimento de irreparável perda: sonharei que meus dentes incisivos estarão como sempre estiveram, no lugar, apesar dos meus quase sessenta anos, e abrindo-se num sorriso amigo para não mais o Emerson da cantina, mas o Emerson de novas empreitadas e desafios no mundo espiritual.
ANTONIO CARLOS TÓRTORO
COMENTÁRIOS SOBRE O ARTIGO ACIMA:
Caro Toninho
Incrível a morte de nosso amigo Emerson.
Sempre tive ótimo relacionamento com ele, sempre educadíssimo e sempre reservado, sorriso calmo como seus gestos…
Assim, por nossas vidas passam e passarão muitas pessoas que nos ajudam a escrever esse livro chamado Vida… um capítulo bom das páginas do Anchieta…
Emerson vai com Deus: nos veremos em breve…
Marco Pires