UMA HISTÓRIA DO PERU.
“…fusão que só pode se expressar adequadamente traumatizando-se a sintaxe: eu lhe me entrego, você me se masturba, chupe-se-me-nos”.
É quase sentir-se como um voyer quando mergulhamos nas páginas surpreendentes da literatura erótica do peruano Mario Vargas Llosa em Elogio da madrasta.
Concordo com a opinião do The Washington Post Book World: “Llosa é um mestre na arte de contar histórias”.
Lucrecia e don Rigoberto vivem em contínua felicidade. Ela, que acaba de completar 40 anos, nada perdeu de sua elegância e sensualidade; ele, no segundo casamento, descobriu finalmente os prazeres da vida conjugal. Juntos, creem que nada pode afetar esse idílio cheio de fantasias e sexo.
Alfonso, ou Fonchito, filho de don Rigoberto, parecia ser o único empecilho; amava demais sua mãe, Eloísa, para aceitar a chegada de uma madrasta. Mas até ele foi conquistado pelos encantos de dona Lucrecia.
O amor do menino por sua madrasta, entretanto, vai muito além do que se esperaria de uma criança, criando uma linha tênue entre a paixão e a inocência que mudará o destino de cada um deles.
Um dos momentos que se torna inesquecível para o leitor é quando ele lê o capítulo intitulado Os palavrões — em que entra em cena “o orgasmo gostosíssimo” de Lucrecia — quase ao final do livro: don Rigoberto faz a leitura silenciosa da redação sobre o tema Elogio da madrasta , escrita por Fonchito na escola, na oportunidade em que lhe foi proposta uma redação com tema livre.
Nessa obra divertida, que recebeu o Prêmio Nobel de Literatura, e que provoca a nossa imaginação, nada é explícito, tudo é simples, mas com alta carga de erotismo nos detalhes deliciosos.
O novo, o surpreendente para mim é que nessa obra, verbal e visual conversam insistentemente, dado o fato de que cada dois capítulos são precedidos por uma pintura clássica que acaba sendo paráfrase resumidora e antecipadora do verbal desenrolado a seguir. A reiteração do mesmo – linguagens diferentes, mas com o mesmo sentido – é o eixo em que se desenvolve a obra.
Mirian dos Santos (Univás/FDSM)1 Joelma Pereira de Faria (Univás/FEPI)2 Ludmila Maria Lino Costa (Univás)3, no artigo O erotismo na obra Elogio da madrasta de Mário Vargas Llosa dizem: “Elogio da Madrasta do peruano Mário Vargas Llosa apresenta aspectos eróticos, elementos profanos e sagrados, que se mesclam aos universais e atemporais conflitos que sempre existiram para o homem. Nessa obra, o autor utiliza um artifício da literatura que, além de propiciar uma visão mais ampla da obra, agrega um valor cultural maior a ela, a intertextualidade. Há em todo texto um diálogo constante entre pinturas clássicas e o texto. Isto se dá nessa novela de Vargas Llosa através de telas de pintores, dos quais cinco se qualificam como clássicos da pintura. A novela está dividida em doze capítulos e um epílogo. E a cada dois capítulos, temos uma tela que serve como premissa do desenrolar da história. Com esse procedimento instala-se no texto o dialogismo, preconizado por Bakhtin, como um dos princípios básicos da linguagem”.
Enfim, pelo título e pela capa, Elogio da madrasta pode sugerir uma sacanagem, um mergulho em um BBB de luxo, mas na realidade ele é mais uma obra prima do grande jornalista, dramaturgo, ensaísta e crítico literário, um dos mais conhecidos e prestigiados escritores da atualidade.
ANTONIO CARLOS TÓRTORO
ancartor@yahoo.com
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