AC TÓRTORO E MACHADO DE ASSIS: UM FOTÓGRAFO

“Escrevi-a com a pena da galhofa e a tinta da melancolia, e não é difícil antever o que poderia sair deste conúmbio.”

Memórias Póstumas de Brás Cubas.

Ao entrar para dar avisos em uma das salas de aula do Ensino Médio, no Colégio Anchieta, estava ministrando aula de Literatura o meu amigo e professor Alexandre Azevedo.
Dentre os avisos que dei aos alunos, estava a divulgação de um concurso nacional de fotografia promovido pelo Grupo Amigos da Fotografia, do qual sou um dos diretores.
Quando mencionei para os alunos a importância da fotografia na vida daqueles que praticam e amam a Arte de Daguerre, o professor Alexandre teceu alguns comentários sobre um fotógrafo que eu desconhecia: Machado de Assis e sua D90, uma pena.
Então, pedi a ele que criasse um artigo sobre o tema: e eis abaixo a joia literária que ele me enviou no dia seguinte:

O FOTÓGRAFO MACHADO DE ASSIS – Alexandre Azevedo

Ao amigo e fotógrafo, Antônio Carlos Tórtoro

Machado de Assis (1839-1908) é, sem dúvida alguma, o maior prosador da Literatura Brasileira, insuperável no romance e no conto. Pertencente ao nosso Realismo – Machado introduziu o período em 1881 ao publicar o romance “Memórias Póstumas de Brás Cubas” –, o “bruxo do Cosme Velho” (apelido este magistralmente dado pelo nosso maior poeta, Carlos Drummond de Andrade, em um dos seus poemas) foi um verdadeiro fotógrafo ao retratar de maneira irônica e com um fino humor a sociedade burguesa da segunda metade do século XIX. O objetivismo, isto é, a intenção de mostrar o mundo de uma maneira mais concreta, supervalorizando a razão em detrimento do sentimento, como forma de combater o estilo romântico, este marcado pelo sentimentalismo e pela criação de um mundo fantástico, o objetivismo é, portanto, uma das características centrais da chamada Época Realista, da qual Machado de Assis é o seu maior expoente. Tentar ser o mais próximo da realidade era um dos maiores desafios dos autores realistas, para isso tomavam do objetivismo – da mesma maneira que um fotógrafo toma de uma câmera fotográfica – e, clique!, retratavam a realidade de tal forma que suas “fotografias” tornaram-se primorosos romances e contos da Literatura Brasileira. Portanto, Machado de Assis se utilizou de sua pena objetiva para revelar ao leitor um mundo recheado de hipócritas, vaidosos, ambiciosos, adúlteros, corruptos e preconceituosos. Uma dessas fotografias é a de Brás Cubas, um dos personagens mais bem construídos de nossa literatura. Ao lermos as Memórias póstumas, fica, para sempre, impressa em nossa memória o retrato três por quatro do protagonista (ou será antagonista?), pois como esquecê-lo, se tão bem retratado foi pelas lentes de seu autor? Aqui chego a minha intenção de comparar o nosso grande Machado a um fotógrafo profissional, já que o objetivismo também está fortemente ligado ao fotógrafo, quando este segura em sua mão não a pena, mas a máquina fotográfica para retratar o seu mundo da melhor maneira possível. Para isso, utiliza-se da objetiva, que nada mais é que um conjunto de lentes que auxilia o fotógrafo nessa sua árdua e prazerosa missão: um retrato cuja imagem prima pela alta resolução. E isso, Machado fazia muito bem. Não há imagens dotadas da mais alta resolução que as imagens retratadas por ele, seja em contos como “A Cartomante”; “A Missa do Galo” e “O Alienista” ou em romances como o já citado “Memórias Póstumas de Brás Cubas”; “Quincas Borba” e “Dom Casmurro”. Quem já os leu sabe muito bem do que estou falando… Machado de Assis foi ou não um mestre da fotografia?!

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